O presidente dos EUA, Donald Trump, não descartou que a maior economia do globo passe por recessão em meio às mudanças impostas pela sua gestão.
“Eu odeio prever coisas assim. Há um período de transição, porque o que estamos fazendo é muito grande. Estamos trazendo riqueza de volta para a América. Isso é uma grande coisa. E sempre há períodos de — leva um pouco de tempo. Leva um pouco de tempo, mas acho que deve ser ótimo para nós”, disse, na entrevista à Fox News que foi exibida no domingo (9).
Pela expressividade dos Estados Unidos e sua conexão com o restante do mundo, uma crise por lá poderia acabar significando em impactos nas demais economias globais, inclusive a do Brasil, que seria afetada por dois caminhos, segundo Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.
“Impacta o Brasil diretamente [pois os EUA acabam] comprando menos produtos, [é] pior para nossos exportadores que vendem para lá”, explica, apontando também para o fato de termos empresas brasileiras com unidades em solo norte-americano.
Os Estados Unidos são hoje o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com uma balança comercial ligeiramente superavitária para os norte-americanos. Em 2024, o Brasil exportou US$ 40,33 bilhões em produtos aos EUA.
“Impacta indiretamente, pois enfraquece o PIB global. Pode provocar queda nos preços das commodities internacionais e diminuir o fluxo de investimento externo”, conclui.
O mercado financeiro norte-americano encerrou esta segunda-feira (10) em queda acentuada após os comentários de Trump. E o efeito também foi sentido no pregão brasileiro, com o dólar fechando em alta e o Ibovespa em baixa.
Os principais catalisadores desses movimentos foram a incerteza e o temor gerados em torno de Trump, após o presidente dos EUA não descartar a possibilidade de uma recessão decorrente de suas políticas econômicas e, mais especificamente, as fiscais.
“Se houver uma recessão nos Estados Unidos, o que parece pouco provável até o momento, ela afetaria o Brasil, principalmente numa decisão de queda na balança comercial. Exportação menor, diminui nossa capacidade de venda”, pontua Fábio Astrauskas, economista e CEO da Siegen.
“A única mudança que ele tem promovido e que poderia ser um indicador de recessão futura é a diminuição do tamanho do governo e dos gastos públicos, e até a demissão voluntária de vários funcionários ligados a órgãos do governo”, diz.
Além de fatores macroeconômicos, também aponta-se para como os mercados reagiriam a uma recessão nos EUA, uma vez que o risco não se limitaria ao país, contaminando as bolsas do mundo — assim como ocorreu nesta segunda com apenas o receio da retração econômica.
“Esse selloff contamina os mercados globais, inclusive o brasileiro, especialmente enquanto há pouca certeza sobre os rumos da maior economia do mundo. O dólar, por exemplo, tende a subir em situações de aversão a risco, com movimentos de rotação saindo de ativos de risco para, por exemplo, a renda fixa americana, considerada um porto-seguro”, indica Paula Zogbi, gerente de research da Nomad.
Há um risco concreto de recessão nos EUA?
Para economistas ouvidos pela CNN, a resposta, no momento, é não.
“No ano passado o PIB dos Estados Unidos cresceu, há uma projeção de crescimento ainda para este trimestre e, tecnicamente, a recessão só é definida quando há dois trimestres seguidos de queda do PIB do país. Isso não está acontecendo, e mais, não há outros sinais que indiquem isso”, avalia Astrauskas.
“O desemprego está baixo e a inflação, que apesar de não estar totalmente dominada, não está totalmente disparada. Então, não há risco de uma recessão concreta nos Estados Unidos atualmente”, pontua.
O que se indica é que o corte de gastos promovido pelo Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) e a manutenção de juros altos no país — em decorrência do potencial inflacionário da política tarifária de Trump — podem acabar limitando a atividade econômica norte-americana.
“A economia tem aversão à incerteza, que reduz o nível de investimento, o otimismo dos consumidores, e numa economia como a americana, isso tende a ter sim impactos recessivos”, observa Robson Gonçalves, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV).
“Quando se soma isso ao fato de a ‘Trumpconomics‘ ser inflacionária, e inflação em geral obriga os bancos centrais em geral a elevarem suas taxas de juros, começa a formar um cenário onde a recessão é mais provável. Nos mercados, em parte, é mera expectativa, mas os agentes econômicos tomam decisões com base em expectativas.”
O problema em questão nesta segunda é a incerteza gerada em torno dos comentários do republicano.
“Normalmente, o discurso seria mais assertivo, afirmando que a política adotada traria impactos positivos e que haveria formas de compensação, como a redução de outros impostos ou medidas para controlar a inflação por outros meios”, pondera Thiago Moraes Moreira, professor de economia do Ibmec-RJ.
“Quando ele dá uma resposta desse tipo, acaba aumentando a incerteza e elevando a tensão no mercado. Esse é, hoje, um dos principais debates dentro da economia global”, explica Moreira.
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